2007-04-28

relações internacionais

apesar do passageiro, que aqui fala, falar em nome do motorista, e daí o discurso directo do diálogo, na verdade, o discurso do motorista é, como se entende, sempre indirecto. quem quiser ouvir, directamente, o discurso do motorista, tem de entrar noutros taxis. além dos dois portugueses e de um norte-americano, chamados em posts anteriores, pode entrar neste que "anda às voltas" algures no brasil.

auto túnel

P: ... mas estes engarrafamentos não serão só nos primeiros dias?
T: oh minha senhora há 36 anos que eu ando aqui às voltas ... isto vai ser assim sempre. viu eles deitarem alguns prédios abaixo para alargar as ruas? ou construirem passagens por cima das ruas, coisas que permitissem andar? então se as ruas são as mesmas, os carros os mesmos, o túnel não vai pôr carros no centro da cidade, como eles dizem, vai pô-los debaixo do chão.
P: se calhar...
T: ... comigo aconteceu esta história. enquanto se estava a construir a auto-estrada de cascais, eu apanhei um senhor que queria ir para caxias que era onde ficavam os estaleiros da obra. fomos a conversar, foi ele a dizer das vantagens da auto-estrada que ia resolver a situação dos moradores da linha e tal, que ia pôr os carros na cidade num instante e mais isto e mais aquilo. eu deixei-o falar, sempre calado e quando ele acabou disse-lhe que pela minha experiência a auto-estrada não ia pôr carros na cidade, ia pô-los na bicha... ele argumentou que não, que tinham sido feitos muitos estudos...os engenheiros (ele era engenheiro) e mais não sei o quê. eu só lhe disse: "o senhor fique-se com o que lhe diz o motorista de praça - a auto-estrada só vai servir para pôr carros na bicha".
por minha sorte, ou infelicidade, há dias atrás apanho um senhor que vinha para a obra do túnel. a certa altura diz-me ele assim: "o senhor teve sempre este carro?"/"não, este é mais recente"/ "então e não se lembra de mim, nem dum serviço que fez há muitos anos, para caxias?"/"não sei talvez mas sabe como é ... eu transporto tanta gente, faço tantos serviços"/"pois eu é que não me esqueci da nossa conversa sobre a auto-estrada de cascais. e até me farto de falar de si aos meus colegas..."
P: então ele estava também a trabalhar no túnel?
T: estava, é engenheiro e trabalha para aquela empresa ... Tâmega.
P: ... certo. mas então como é que se tiram os carros de lisboa - se o senhor diz que não é com parques de estacionamento nas entradas da cidade nem com o pagamento de taxas para entrar, nem com melhores transportes públicos?
T: não se tira. só proibindo. não se tira porque o português é preguiçoso e só não mete o carro debaixo da secretária, no escritório, porque ele não cabe lá...

2007-04-27

mixa


P: não percebi é o que era exactamente uma 'mixa'... é uma colher?
T: chamavam-lhe 'mixa'... eras os miúdos do gamanço com quem eu jogava futebol em alfama. quando eles não estavam na cana claro... lá está, vinha um e dizia para os outros 'esta noite vamos guiar mercedes'. acabava o jogo eles entravam num café, pediam uma bica e fugiam a correr sem pagar... traziam a colher e metiam-na assim na linha do eléctrico. quando ela ficava achatada, servia-lhes de ferramenta para abrir as fechaduras dos carros. isso... entravam em todos os todos os carros que queriam... tinha de ter muito cuidado nessa época, para aí nos anos 70. está bem que eu não vim para cá saloio. os meus velhos lá na terra sempre me foram dizendo isto e aquilo, já sabia como as coisas eram. mas mesmo assim...

2007-04-25

internacionalização


o tek-si alarga os seus horizontes: além do ponto de vista da passageira, ele contemplava já o ponto de vista de dois taxistas portugueses(fogareiro e taxe) nacionais. agora passa a incluir também o ponto de vista de umA taxista nova-iorquina.

2007-04-24

teatro


P: está à espera de alguém não está?
T: não não estou.
.......
P: como o vi aqui parado na rua julguei que estivesse à espera de alguém.
T: estava à espera da saída do teatro. mas já cá estou à meia hora e nada.
P: devia estar parado era do outro lado, em frente do são jorge. está a sair imensa gente e há-de continuar porque há filmes que começam à meia-noite.
T: a senhora veio de lá foi?
P: vim. é aquele festival de cinema, sabe o indie que tem filmes em vários cinemas
T: não não sabia mas a a essa hora já não há metro... hei-de lá passar a perguntar a que horas acaba. é que isto não há nada para fazer, é mesmo uma tristeza.
P: mas hoje em particular ou é todas as noites?
T: é todas as noites ... por isso é que eu me ponho à porta do teatro. fora disso não há ninguém. nada mesmo, é uma tristeza. ninguém sai de casa à noite...

de tek-si a taxe


já me tinha apercebido que neste mundo de cá era corrente o termo 'taxe'. assim aparece ele no cabeçalho deste blog, de outra alma gémea certamente, e bem mais bonito do que este.

de pressa(s)

P: o sr importa-se de ir um bocadinho mais devagar? é que eu não gosto nada de andar a esta velocidade.
T: a senhora não tem pressa?! mas olhe que toda a gente me pede para ir depressa, ou porque vão apanhar o combóio ou para o aeroporto, ou sei lá para onde. ainda agora duas rapariguinhas até me pediram para passar um sinal encarnado...
P: pois é mas na minha idade já não se tem pressa
T: outro dia era um senhor muito gordo, mesmo gordíssimo, que só me dizia para eu acelerar. mas tudo tudo aí parado, não se podia avançar...ia para um bar ou lá o que era...
P: ah então é por isso, como de dia não pode acelerar à noite tira a barriga de misérias...
T: e depois chegámos lá a um bar ou lá o que era, de caracóis e cerveja e os amigos até lhe disseram que se ele não tivesse chegado já não tinha nada para comer...

2007-04-22

a proliferação da "escultura" na cidade

P. boa, outra "escultura" pública!
T: ...esta é afecta ao instituto superior técnico.

2007-04-21

solidariedade


sobre a importância de se chamar Táxi

boila!


à procura de fotos de taxis, na internet, parece que encontrei uma alma gémea

2007-04-20

rua de bucareste


T: esta rua aqui é a rua de bucareste. mas ninguém sabe, não há cá nada a dizer...
P: deve ser a única rua da cidade sem nome não?
T: não, há para aí muitas. só em telheiras são várias. nem uma coisa de madeira a dizer o nome. eles lá darem-lhes nomes dão agora porem as placas está quieto...

2007-04-19

teoria do push-pull


T: e o vidro, ainda por cima, fica mal limpo. às vezes o sinal abre e lá fica a lavagem a meio...
P: e é perigoso. não ganham nada e arriscam a vida
T: o que eu sei é que são cada vez mais, é uma verdadeira praga. sabe como é, puxam uns pelos outros... o que me espanta é eles terem carros com matrículas portuguesas.
P: mas pessoas como aquelas duas rapariguinhas com um ar tão pobre que estavam lá em baixo têm carro!?
T: então não têm?! é onde eles dormem, todos juntos com os filhos. ali ao pé do hospital de st. maria houve tempos que até parecia uma cidade...está bem que são carrinhas usadas mas mesmo assim como é que têm dinheiro?
P: devem-se ter empenhado antes de partir. ainda devem estar a pagar...
T:veio aí há pouco tempo um rapaz, romeno também, mas esse andava nas obras, que me disse que eles lá na terra deles cortavam um braço ou uma perna, o que fosse, para depois virem pedir. só no campo grande há três um sem uma perna e dois sem braço...

2007-04-18

reconhecimento


T. um é médico e o outro não quis estudar. ficou ele encarregue disto.
P: então agora é ele o patrão e o senhor o empregado?!
T. é isso mesmo. é um descanso.
P: olha que sorte a sua! ter podido passar a pasta aos filhos quando ela já lhe custava a transportar...
T. isto já era do meu pai. eu é claro que tinha gostado que os dois tivessem estudado. mas sabe como é, a gente tem de aceitar as escolhas dos filhos.
P: isso é verdade
T. eles sempre foram diferentes - o mais novo nunca gostou de estudar. só o mais velho é que se formou. mas mesmo agora que já é médico ainda continua a vir aqui fazer umas horas. quase todos os domingos. eu até já lhe tenho perguntado o que é que ele vai dizer se um dia lhe entra aqui um doente lá do hospital que o reconhece...

hipocrisia

T. olhe para lhe dizer francamente não sei...
P. tem qualquer coisa de mausoléu, fúnebre e rico...
T. talvez... e está aqui bem colocado ao pé da mesquita dos ricos...
P. qual mesquita dos ricos? mas então há uma para pobres?
T. claro, nesta aqui é só grandes carros à porta. a outra, olhe que nem sequer foi acabada,apesar de ser mais antiga. essa na praça de espanha é para os pobres, vê-se por quem lá vai.
P. o aga khan é muito rico...
T. sim claro... na outra é sobretudo imigrantes pretos, coitados mais do género pé descalço.

daí passou-se para as divisões religiosas no seio do islão, sem nunca se perder de vista as económicas, e da forma como elas têm vindo a ser aproveitadas pelo ocidente. já estávamos na palestina quando o carrou e ainda esperei, depois de pagar, para (ter o prazer de) ouvir o meu interlocutor comentar a hipocrisia de se defenderem eleições e democracia para depois não aceitar os seus resultados, isto é, cortar o auxílio os palestinianos depois da vitória eleitoral do hamas

discriminação

T. isto qualquer dia em lisboa não há portugueses nesta profissão. já vejo para aí tantos brasileiros e russos...
P. mas porquê? os portugueses não querem ser motoristas de táxi? pelo salário ou pelas condições de trabalho?
T. não é tanto por isso... é porque isto é uma profissão muito discriminada.
P. discriminada?
T. então toda a gente diz mal dos taxistas. as vezes estou assim com pessoas da família e amigos e oiço-os dizerem que os motoristas de taxi isto e aquilo. dizem sempre, entre eles. depois lembram-se que eu sou taxista e então 'ah não é bem assim' ou 'não são todos', ficam envergonhados comigo e começam a recuar.
P. olhe eu não digo nada disso...pelo contrário, as conversas mais engraçadas dos meus dias são geralmente tidas com taxistas. mesmo fantásticas, algumas
T. isso é porque a senhora tem experiência de andar, sabe como isto funciona. esses que dizem mal de nós são os que nunca andam ou andam muito pouco de táxi.
P. eu tenho sido sempre muito bem tratada. o senhor se calhar nem acredita se eu lhe disser que me tem apetecido criar um blog só para transcrever as conversas que vou tendo com os senhores taxistas...
T. até já há um que se chama 'fogareiro'. a senhora procure que vai encontrar...
P.ah que engraçado, um blog... mas de um motorista de taxi ou como é?
T. isso não sei bem mas é tem que ver com táxis. chama-se 'fogareiro' ou um nome como 'fogareiro'. a senhora procure que vai encontrar
P.vou procurar sim senhor...